segunda-feira, 27 de setembro de 2010

MISTAGOGIA

OFICINA: Mistagogia
Seminarista Aldevan

O tema da mistagogia nos conduz à teologia desenvolvida pelos Santos Padres. Uma teologia que envia à Liturgia, à pedagogia divina, à dinâmica da Revelação, à fé como experiência pessoal e comunitária, à Igreja como sacramento de Jesus Cristo no mundo. Compreendemos que, seja qual for o campo de atuação pastoral, deve haver uma pedagogia própria que perpassa a ação evangelizadora. Uma pedagogia que se dá a partir de um diálogo que Deus vai tecendo amorosamente com cada pessoa e com cada comunidade e que se torna como um “eco” desta autocomunicação divina, uma mediação entre a ação divina e a realidade pessoal, histórica e social.
Perguntamo-nos, então, como se desenvolveu o processo de evangelização na caminhada inicial da Igreja? Teriam, os primeiros discípulos, na sua prática de anunciar a Boa Nova, uma pedagogia própria? Ao estruturar o catecumenato primitivo, os Padres da Igreja estavam atentos à dinâmica da Revelação? Poderíamos encontrar na experiência fontal da Igreja dos primeiros séculos a orientação que buscamos para a ação evangelizadora hoje?
Buscando nas fontes mais antigas e primeiras da tradição eclesiástica, encontramos uma experiência da iniciação à fé cristã que é fonte da sabedoria patrística: a experiência mistagógica de Cirilo de Jerusalém, presente em suas homilias voltadas aos catecúmenos e aos neófitos, em fins do século III e no século IV.
Contudo, a teologia dos Padres bebe nas fontes primitivas, na Igreja dos primeiros tempos e na evangelização apostólica: momento primeiro e fundante do cristianismo, caracterizado fortemente pela obra do Espírito Santo, que suscita e vivifica a comunidade nascente, age nela e por ela. A Igreja dos primeiros séculos é missionária porque vive a experiência forte e revolucionária do mistério pascal, Cf. DGC n. 144.e não pode fazer outra coisa a não ser transmiti-lo como novidade e alegria. “Cada batizado era, para seu ambiente, uma testemunha”.
Esta teologia torna-se normativa para a prática evangelizadora de todos os tempos e situações. Nela encontramos a dinâmica da Revelação vivida sob o impulso das expectativas, das resistências e dos desafios do ambiente de vida em que a comunidade experimenta os primeiros passos e interpelações ao Cristianismo diante do cotidiano e do mundo. É uma teologia que nasce no seio vivo de uma comunidade a caminho e, no entanto, sob o impulso renovador e transformador de todas as estruturas: a Ressurreição de Jesus Cristo.
A Igreja nascente, seguindo a trajetória da evangelização apostólica, dedicava grande cuidado à iniciação à fé cristã e seguimento de Jesus. A atividade que se iniciou com a pregação missionária passou por um processo de organização e de estruturação e veio a se tornar uma instituição eclesial, denominada catecumenato.
O Cristianismo primitivo passa a empregar o termo específico katecheo, que significa, basicamente, ensinar de “viva voz” sobre a ação salvífica de Deus. Segundo esta concepção, o ensinamento catequético é como um eco, o ressoar da Palavra de Deus mediante a voz do catequista. Na verdade, a catequese era tida como a transmissão viva do depósito de fé da Igreja aos novos membros que a ela se agregavam. O catecúmeno seria aquele que está sendo iniciado nessa “escuta”, não de uma palavra qualquer, mas da Palavra de Deus.

A MISTAGOGIA COMO EIXO REFERENCIAL DO CATECUMENATO DOS SÉCULOS III E IV
No catecumenato antigo, a Iniciação Cristã foi orientada como um caminho de introdução, abertura e diálogo com o Mistério de Deus. O princípio fundante e dinamizador do caminho é o próprio Deus que se revela na história a cada homem e mulher, em seu tempo e lugar.
A espiritualidade, a liturgia e pedagogia são dimensões integradas no caminho de Iniciação Cristã na Igreja dos séculos III e IV. A relação dialógica entre estas três dimensões fundamentais do processo de Iniciação Cristã ocorre porque os Padres da Igreja possuem uma teologia de fundo: a mistagogia. Segundo E. Mazza, a mistagogia foi conhecida na tradição como a explicação teológica do fato sacramental ou dos ritos que compõem a celebração litúrgica, contudo é muito mais do que um gênero literário ou uma metodologia pastoral-litúrgica. A mistagogia é a teologia dos primeiros tempos.
O termo mistagogia tem sua origem em dois vocábulos gregos: mystes, que significa mistério, e agein, que significa conduzir. Mistagogia vai adquirir o sentido de ‘conduzir através do mistério’, ‘iniciar ao conhecimento do mistério’. Este novo termo, construído na conjugação destes dois vocábulos, carrega em si um sentido profundo: o enraizamento no conceito de mistério e a ação mediadora, de aproximação deste mesmo mistério.
A palavra ‘mistagogia’ também aparece nos cultos pagãos – conhecidos como cultos mistéricos -, contudo, não podem ser concebidos como análogos à mistagogia dos Padres do III e IV séculos. Etimologicamente possui o sentido de ser conduzido para o interior dos mistérios, e, na Iniciação Cristã, para o Mistério que é “Cristo em nós, esperança da glória” (Cl 2,19). Na antiguidade cristã, o termo ‘mistagogia’ designa, sobretudo, a explicação teológica e simbólica dos ritos litúrgicos da iniciação, em particular do Batismo e da Eucaristia. Outro sentido para a mistagogia está relacionado à ação sacramental, que configura o neófito como nova criatura, renascido pela água do Batismo e alimentado com o Pão da Vida.
São os Padres Capadócios os primeiros a aplicarem o termo mistagogia às ações sacramentais do Batismo e Eucaristia. Em Gregório de Nazianzo, o termo mistagogia indica a ação sacramental em três expressões: o Batismo, a Eucaristia e o ministério presbiteral, visto como exercício da mistagogia, que o sacerdote cumpre em nome de Cristo, em virtude de sua ordenação.
Ambrósio de Milão apresenta suas homilias de caráter mistagógico  sempre depois dos sacramentos da Iniciação Cristã. Suas explicações pressupõem a experiência do Mistério de Deus através de descrições, questões e aprofundamento.
O termo ‘mistério’ aponta para uma realidade desconhecida, íntima, oculta, uma presença por se revelar. No Cristianismo, o Mistério de Deus se revela à humanidade e convida a uma abertura existencial, que conduz tudo e todos à plena realização. É a História da Salvação, plenificada na encarnação, na redenção, na Páscoa de Jesus. É o Mistério pascal, ou Mistério de Cristo, Mistério da fé.
A liturgista I. Buyst apresenta dois momentos constitutivos do Mistério pascal que se faz presente nas celebrações eucarísticas: a liturgia da Palavra e a liturgia sacramental. “Na liturgia, o mistério pascal de Jesus se faz presente, em toda a sua densidade e extensão, atuando no rito litúrgico, na celebração memorial, principalmente na celebração eucarística. É o mistério da fé presente na e pela ação ritual que inclui: a narrativa e interpretação dos fatos - liturgia da Palavra -; e as ações simbólicas relacionadas com esses fatos - liturgia sacramental”.
A fonte deste saber reside na elaboração dos Padres da Igreja da liturgia recebida pelas tradições apostólicas, em diálogo com as reflexões teológicas de seu tempo. A Palavra de Deus é fonte mistagógica e as ações litúrgicas são sinal e presença do próprio Cristo, mistagogia viva e fecunda para a comunidade eclesial que se reúne em torno deste altar. Desde estas releituras, podemos compreender mais facilmente os dois elementos mais constantes na concepção de ‘mistagogia’ nos Padres da Igreja: a liturgia sacramental e a sua explicação teológica. Cirilo elabora sua teologia a partir dos Padres Gregos e de autores judeus e pagãos, como Filon e Plotino. Sua obra é largamente documentada com escritos exegéticos, morais, ascéticos, dogmáticos, além de discursos, cartas e hinos.
Para além destes dois elementos acessíveis na teologia dos Padres, encontramos outros sentidos igualmente relevantes para compreendermos a mistagogia como fundamento teológico de suas reflexões e ações litúrgico pastorais. Elencamos abaixo diversos sentidos para a mistagogia, a partir dos termos encontrados nas obras patrísticas do século III e IV:
  • Como iniciação ao Mistério;
  • Como instrução nos Mistérios divinos;
  • Como exposição dos significados da Sagrada Escritura;
  • Como orientação, guia no caminho misterioso de Deus;
  • Como o próprio Mistério que se revela;
  • Como a própria Sagrada Escritura;
  • Como ação sacramental – Batismo e Eucaristia;
  • Como celebrações dos ritos;
  • Como o tempo da Páscoa, incluindo o período quaresmal;
  • Como princípio fundante e dinâmico do sacerdócio;
  • Como Povo de Deus a caminho;
  • Como Igreja, sacramento de Cristo no mundo.
Importa para nós o fato de que a ‘mistagogia’ para os Padres é um eixo diferente do eixo catequético. É a referência central de sua teologia, a partir da experiência espiritual da Igreja enquanto comunidade de fiéis, que tem sua razão de ser na vivência, sempre mais profunda, do Mistério Pascal do Senhor.
Na sabedoria dos Padres da Igreja, a mistagogia é a vida da Igreja, em sua dimensão espiritual, litúrgica, pastoral, contemplativa e escatológica. Esta sabedoria é expressa nas obras patrísticas revelando os vários aspectos que envolvem sua compreensão de mistagogia:
ü  É fonte de abertura à dinâmica da Revelação;
ü  É caminho, percurso, trajetória de adesão, crescimento, aperfeiçoamento;
ü  É participação nos ritos e celebrações litúrgicas;
ü  É a Palavra acolhida e que revoluciona a dinâmica pessoal e comunitária;
ü  É contemplação orante do Mistério que se revela na história da humanidade;
ü  É a penetração progressiva até o encontro definitivo com o Mistério de Deus;
ü  É a Igreja sacramental e caminhante no mesmo processo mistagógico.
A mistagogia nos Padres dos séculos III e IV é tudo isto, mas é ainda mais. Porque não é um conceito que se esgota nas categorias teológicas. Sublinhamos as duas mãos na dinâmica da Revelação – Deus e a pessoa humana – e, nessa perspectiva, podemos perceber o caráter ativo e criativo deste processo nos contextos pessoais, comunitários, sociais, históricos e escatológicos. A mistagogia é um fundamento e uma experiência na qual se entra e se caminha até o encontro definitivo de toda a Criação em Deus.

O CAMINHO MISTAGÓGICO NAS CATEQUESES MISTAGÓGICAS
As Catequeses Mistagógicas orientavam-se à instrução dos neófitos, como um percurso de introdução à fé, incluindo o catecumenato e a instrução batismal. As Catequeses Mistagógicas são um valioso testemunho de como a Igreja, no final do século III e início do século IV, vivenciava este período catecumenal, do desenvolvimento alcançado pela consciência dogmática eclesial, e a imprescindível relação entre a catequese e liturgia no processo de Iniciação Cristã. Cirilo de Jerusalém, em unidade com os seus contemporâneos, consideravam a mistagogia como um tempo forte e determinante para o conhecimento e para a adesão à fé e privilegiava o trabalho de iniciação à vida cristã.
A catequese mistagógica pressupunha as etapas anteriores e a dimensão da graça sacramental dos sacramentos de iniciação - Batismo, Confirmação e Eucaristia -, recebidos na vigília pascal. Era uma nova etapa catequética e sacramental, delimitada pela oitava pascal e que poderia estender-se até Pentecostes. Compreendia-se que os neófitos, renovados em seu espírito, assimilavam mais profundamente os mistérios da fé e os sacramentos da Igreja, experimentando quão “suave é o Senhor”. (Mt 11,30)

MAS O QUE É MISTAGOGIA?
Mistagogia é uma palavra que está sendo bastante usada ultimamente no estudo da catequese, da liturgia, da teologia. O Concílio Vaticano II já havia decidido pela restauração do catecumenato, com seu tempo de mistagogia, para as pessoas que aderem pela fé a Jesus Cristo e querem fazer parte da comunidade cristã. O RICA (Ritual de Iniciação Cristã de Adultos) incorporou este tempo de mistagogia. Tanto o Diretório Nacional de Catequese, quanto o recente publicado Diretório Nacional 2, insistem na dimensão mistagógica da formação cristã. O papa João Paulo II disse: “É mister (...) que os Pastores encontrem a maneira de fazer com que o sentido do mistério penetre nas consciências, redescobrindo e praticando a arte mistagógica , tão querida aos Padres da Igreja.”  Na teologia litúrgico-sacramental começa a se impor o método mistagógico , no qual se faz teologia partindo da análise do rito e da experiência do mesmo  . Numa carta escrita em preparação à 5ª Assembléia Geral do CELAM, o teólogo Jon Sobrino sugere que, em vez de insistir na mera doutrina, devemos oferecer mistagogia e credibilidade. “... cada vez é mais necessária a mistagogia que conduz ao mistério de Deus. Significa introduzir-nos num mistério que é maior, mas que não reduz a pequenez, que é luz, mas que não cega, que é acolhida, mas que não impõe”.
O que está em jogo na mistagogia? Nada mais, nada menos que nossa relação com o mistério de Deus, que é o mistério de nossa própria vida e da história. Ninguém consegue ‘explicar' Deus. É impossível reduzir a realidade de Deus a conceitos racionais. É impossível reduzir a fé à aceitação de dogmas. É necessário que sejamos ‘iniciados' no mistério, não somente com palavras, mas principalmente através de ações simbólicas, através de ritos. No sentido original, são os ritos (as celebrações litúrgicas) que têm esta função mistagógica de nos conduzir para dentro do mistério.
Na cultura atual, chamada de pós-moderna, onde percebemos os limites da razão, abre-se uma nova possibilidade para a liturgia como caminho mistagógico. Liturgia não é um tipo de ‘ginástica', ou uma execução de gestos mágicos ou puramente estéticos ou devocionais. Cada palavra, cada gesto, cada movimento... ‘contém' o mistério e nos faz mergulhar nele: no mistério de Deus, no mistério da vida, no mistério da história, em nosso próprio mistério.
Antigamente, na época do Catecumenato, o Tempo Pascal era dedicado à Catequese Mistagógica. Assim, aquelas pessoas que tinham sido batizadas na noite de Páscoa, recebiam uma catequese que visava “o progresso no conhecimento do Mistério Pascal através de novas explanações, sobretudo dos sacramentos recebidos e ao começo da participação integral da Comunidade” (DNC, 46 d).
Nos dias de hoje a Igreja pede que todo processo catequético tenha uma inspiração catecumenal. Isto quer dizer, entre outras coisas, que devemos valorizar mais esta dimensão mistagógica das nossas catequeses. Seria como tentar responder a esta pergunta: depois que nossos catequizandos receberam o sacramento, nós vamos fazer o que com eles?
Na catequese mistagógica, mais do que ponto de chegada, os sacramentos passam a ser ponto de partida e de crescimento da fé e da vivência cristã. Este tipo de catequese supõe um envolvimento maior da comunidade dos fiéis, uma aproximação mais orante dos Evangelhos, uma freqüência maior aos sacramentos, o aprofundamento destes mistérios celebrados na liturgia, a vivência concreta da caridade que vai consolidar a prática da fé cristã, incorporando mais profundamente o fiel à Comunidade.
Se realmente sonhamos com a Catequese Permanente, não tem como ignorar este jeito de fazer catequese. A Catequese Mistagógica é, sobretudo, litúrgica e tem um cuidado especial com a introdução do catequizando nas celebrações dominicais. De fato a verdade última da celebração não é somente o ato sacramental, mas o que nasce e continua depois dele.
Portanto, para se fazer uma boa Catequese Mistagógica, é necessário:
  • Levar o catequizando a compreender os símbolos, gestos e palavras dos sacramentos que participa, não mais a partir de conceitos abstratos, mas da experiência dos dons recebidos de Deus;
  • Ajudá-lo na interpretação dos ritos à luz da Bíblia na perspectiva da história da salvação; por isso, mais do que obrigação, a participação nos ritos passa a ser vista como uma necessidade de celebração de sua autêntica fé;
  • Inserir o catequizando na comunidade em vista da abertura ao compromisso cristão e eclesial como expressão da sua nova vida em Jesus Cristo.
Ao fazermos a programação da nossa catequese temos que prever também este tempo após a celebração dos sacramentos, que não será um simples “esticar” a catequese, mas sim parte integrante e complementar do processo. O aprendizado não se conclui com a recepção dos sacramentos e nem se esgota ao se chegar a certa idade, mas requer um constante e contínuo amadurecimento.

METODOLOGIA
Após a Crisma, os crismados continuam a se encontrar para completar sua formação cristã e sua integração na comunidade. Este período após Crisma chama-se tempo da Mistagogia. É o tempo em que os crismados procuram tirar as últimas dúvidas e esclarecer tudo o que ainda precisa ser esclarecido. É um período de grande importância para o recém crismado. Além da participação nas celebrações dominicais, terá lugar de destaque na assembléia e será lembrado na homilia e na oração dos fiéis. Com o auxílio do acompanhante, entra em relações mais estreita com a comunidade, começa a assumir serviços e a aprofundar os conhecimentos a respeito das diversas pastorais.
Os encontros podem ser no estilo de retiros ou encontros de dias inteiros, de acordo com os sacramentos recebidos e também com temas propostos pelos próprios crismados. Para encerrar recomenda-se uma celebração festiva. Cada família poderá levar um prato para partilhar, ou a comunidade providenciar outra forma. Pode-se também fazer um amigo secreto, uma gincana com perguntas relacionadas ao catecumenato crismal, um bingo e até uma brincadeira dançante.
CELEBRAÇÕES: Celebração Eucarística; Celebração da Palavra. Seria interessante encerrar esses encontros com alguma celebração. Por exemplo: celebração do Mandato Missionário e outras.
ATIVIDADES: Definir o compromisso comunitário; Dar continuidade a formação permanente; Confraternizações e Gincanas.
RESPONSÁVEIS: São responsáveis por este tempo os anteriormente citados, as lideranças em geral, com destaque para as pastorais da juventude.
CONCLUSÃO
A mistagogia é concebida como o princípio que funda e dinamiza a Iniciação Cristã de Adultos, desde o catecumenato antigo. Nos Padres da Igreja, a mistagogia se apresenta como fundamento, como caminho de iniciação cristã, como via de integração da pessoa ao Mistério de Deus. O próprio termo nos indica essa dupla vertente, pois é composto por dois elementos – o mistério e a pedagogia. Trata-se, portanto, de uma Iniciação ao Mistério de Deus, no que diz respeito à fé cristã.
Encontramos essa mesma concepção mistagógica em Ambrosio e João Crisóstomo. Ambrosio fala da força dos ritos por seu próprio simbolismo e sua linguagem luminosa, e João Crisóstomo, argumenta que apenas os iniciados podem penetrar o mistério de Deus. Compreendendo o Mistério de Deus como já presente em toda pessoa humana, pela graça que nos insere nele mesmo, os Padres da Igreja desenvolvem um processo de Iniciação Cristã que viabilize a experiência de abertura e percepção consciente da presença do mistério em si mesmo e na história.
No centro da experiência mistagógica está Jesus Cristo. Ele é o caminho, porque ninguém vai ao Pai se não por meio dele, dado que ele é vindo do Pai e ao Pai retorna, “dando-se como exemplo de porque o seguimos, dando-se o mesmo Espírito pelo qual caminhamos na sua estrada, escutamos sua voz, nos aproximamos com um coração capaz de conhecer os dons que nos tem dado”.
A patrística tem na liturgia o lugar privilegiado e central da experiência de participação no Mistério pascal. A liturgia é teologia em ato, presença dinâmica e operativa do Verbo de Deus oferecido em diálogo de comunhão aos homens. A liturgia é teologia primeira, fundamento de toda teologia segunda ou reflexão sistemática dos mistérios da fé. Por isso mesmo, a teologia dos Padres nos chega, na maior parte, expressada em um contexto litúrgico.
O primado da Iniciação é a própria iniciativa divina, da qual se coloca como mediador em unidade com a Igreja, sacramento de Jesus no mundo. Cirilo abre a porta a todos, pedindo apenas a disponibilidade da escuta interior que provoca a conversão existencial. A peculiaridade de sua linguagem não é um instrumento de comunicação, mas uma mediação mistagógica, de transmissão da verdade revelada na Palavra de Deus, na História da Salvação. Sem perder de vista as ações litúrgicas, fonte da experiência de participação no Mistério, Cirilo conduz os neófitos por caminhos já trilhados, a fim de aprofundarem e tomarem consciência da beleza e grandeza do caminho do seguimento de Jesus.
São categorias mistagógicas que se tornam fonte de sabedoria para todos os tempos: a centralidade da Liturgia, o ponto de referência na Sagrada Escritura, a comunhão com o Povo de Deus a caminho, a contemplação da presença de Deus no mundo, a consideração atenta das questões contemporâneas, o fortalecimento dos catecúmenos e neófitos para as lutas de seu cotidiano.
Em Cirilo, a mistagogia é um caminho no qual ele se insere e também se vê interpelado a aprofundar. Por isso mesmo é capaz não apenas de orientar, mas oferece o testemunho pessoal da graça fecunda de Deus, garantindo uma profunda harmonia entre seus ensinamentos e o caminho mistagógico que orienta aos neófitos.
Nas Catequeses Mistagógicas, Cirilo revela sua compreensão de mistagogia como momento interior ao mistério, do qual ele procura explicitar e convidar cada neófito a acolher o dom de Deus que recebeu. A cada passo, Cirilo vai convidando o neófito a experimentar a profunda comunicação de Deus na vida de cada pessoa, estabelecendo entre o neófito e Deus uma relação de proximidade e intimidade que se tornará, processualmente, seu referencial.
A mistagogia é uma dinâmica, que convida e impele a vida de cada pessoa que aceita o convite de Deus para essa experiência fundamental, a assumir sua vocação primeira, sua vocação cristã. Por isso mesmo, não consiste senão em viver plenamente o Mistério Pascal na própria existência cotidiana; morrer e ressuscitar diariamente com Cristo para oferecer assim ao Pai o sacrifício agradável aos seus olhos. É nesse dinamismo que a mistagogia, enquanto princípio e caminho se, torna sabedoria fontal da Igreja e em cada um dos fiéis.

BIBLIOGRAFIA
BUYST, I. E SILVA, J. A. O Mistério celebrado: memória e compromisso. São Paulo: Paulinas, 2004
CNBB. São Paulo: Paulinas, 2005
CATEQUESE. In: CNBB. Segunda semana brasileira de catequese. Doc. 84 São Paulo: Paulus, 2002
CELAM. Manual de Liturgia, vol. II. São Paulo: Paulus, 2005
CNBB. Conferencia nacional dos bispos do Brasil. Diretório Nacional de Catequese. Texto aprovado pela43ª assembléia geral Itaici – Indaiatuba – SP, 09 – 17 de Agosto de 2005. Paulinas, 2006.
Diretório Geral para a Catequese. Congregação para o clero. 5ª Ed. São Paulo: paulinas, 2009 – coleção pedagogia da fé.
PUC-RIO – Certificado digital. Nª 0420964/CA. (pesquisado na internet)

Um comentário:

  1. Aldevan, O último documento citado, da PUC-Rio é de autoria minha, e gostaria muito que fosse citado corretamente, pois o texto é quase integralmente de minha autoria.

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